terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Roubaram meu conto de fadas

por Manuela Andrade

Era sábado de tarde e minha irmã mais nova queria ver um filme e comprar uma revista. Até então, tudo na mais calma serenidade até que nós chegamos à banca. Assim que colocou os olhos na prateleira, Luísa, minha irmã de onze anos automaticamente pegou uma revista. Quando olho para a capa vejo uma série bonequinhas pré-adolescentes com roupas mais erotizadas do que a da Britney Spears no último clipe. Neste momento, confesso que levei dois choques; saber que minha irmãzinha não ia comprar um gibi da Magali de sempre e tentar engolir que ela iria levar aquelas marionetes esqueléticas em quadrinhos pra casa. Tentei através dos meus incansáveis argumentos que ela procurasse outra coisa, mas a verdade é que não tinham muitas opções. Ou seja, caso perdido.
Na locadora, a mesma decepção, a número ínfimo de desenhos animados ou filmes infantis que minha irmã ainda não tinha visto não mereciam atenção.
Deixei para lá, até que o fato começou a se repetir. Assim, após diversas idas à banca e à locadora pude, então, comprovar a minha tese. Não existe uma preocupação em produzir filmes e revistas interessantes (não me refiro a HQs, pois o aceso é mais restrito) para crianças de onze anos, nem de dez, nem de nove, nem de...
Desta maneira, os pirralhos acabam consumindo, muitas vezes, a reprodução de produtos para adultos em versão infantil. Como é o caso da revista Witch, que parece uma versão da Capricho para crianças. Os anúncios publicitários e o merchandising se confundem em toda a publicação, propagando da forma mais sonsa o consumismo doentio como uma qualidade humana. Além disso, a revista comete o absurdo de anexar anúncios de produtos de beleza que não tem o menor cabimento em serem utilizados por crianças; as quais muitas vezes não terão a menor capacidade de manuseá-los.
Já em relação à produção fílmica, fica complicado realmente fazer uma generalização assim, afinal de contas clássicos como A Viagem de Chihiro existem e alguns exemplares de Snoopy empoeirados ainda estão no fundo das locadoras em VHS. Mas, no grosso, o que sobra são as megaproduções Pixar e Disney que dizem pouco sobre reais conflitos das relações humanas. Nos filmões hollywodianos produzidos para criança as metáforas funcionam como mera alegoria, mera piada.
Como estimular crianças as quais sua inteligência é subestimada constantemente para começarem a realizar reflexões menos superficias sobre a realidade? Como instigar a leitura se nas revistas “pops” as cifras ocupam mais espaço que a informação? De que maneira apresentar a arte como um instrumento de contestação mais adiante se na infância ela funciona apenas como indústria de risos?
Um dia ainda dou de presente uma locadora e uma biblioteca pra Luísa.

Para divagações acadêmicas sobre o tema...

Um comentário:

Ana disse...

A alienação já de certa forma gerada na fase de formação de idéiais e opiniões realmente é desesperadora.
Estou com você pra mudar essa realidade na medida do possível!
Muito bom o post.
:)